A questão aborda o romance “Enquanto Deus não está olhando”, de Débora Ferraz.
Assinale a única alternativa CORRETA sobre a filiação estética do romance de Débora Ferraz:
Me dá licença, minha senhora
Clarice Lispector
Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro exatamente por que disse, mas disse com sinceridade.
Hoje repito: é uma maldição. Mas, maldição que salva. Não estou me referindo muito a escrever para jornal. Mas àquilo que eventualmente pode se transformar em conto ou romance. Ou novela (acabei uma agora).
É uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso, do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação. Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se entende a menos que se escreva.
Escrever é tentar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o fim o que permaneceria apenas vago e sufocador.
Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada. Pena que só sei escrever quando espontaneamente a “coisa” vem. Fico, portanto, à mercê do tempo. E, entre um escrever e outro, passam anos. Anos de carência. (...)
Falei em carência. Pior que carência é o súbito cansaço de tudo. É uma espécie de fartura, parece que já se teve tudo e que não se quer mais nada. Cansaço, por exemplo, dos Beatles. E cansaço também daqueles que não são os Beatles. Cansaço inclusive de minha liberdade íntima que foi tão duramente conquistada. Cansaço de amar um homem e de repente ver que ele não merecia esse amor: ele era grosseiro, arrogante e covarde. Melhor seria o ódio. (...)
Não sou dada a festas. Mas estive numa reunião, pouco antes da morte de Guimarães Rosa. Ele disse que, quando não estava se sentindo bem, quando estava deprimido, relia trechos do que já havia escrito. Espantaram-se os presentes quando eu disse que detesto reler coisas minhas. Alguém observou que o engraçado é que parece que eu não quero ser escritora. De algum modo é verdade, e não sei por quê. Até ser chamada de escritora me encabula. (...)
Guimarães Rosa então me disse uma coisa que jamais esquecerei: disse que me lia “não para a literatura e sim para a vida”. E citou frases e frases minhas, que ele sabia de cor e eu não reconheci nenhuma. Acho que sou mesmo esquisita, mas o que há de se fazer? (...)
Uma vez me ofereceram a oportunidade de fazer uma crônica de comentários sobre acontecimentos, só que essa crônica seria feita para mulheres e a estas dirigidas. Terminou dando em nada a proposta, felizmente. Digo felizmente porque desconfio de que a coluna ia descambar para assuntos estritamente femininos, considerando “feminino” o que geralmente os homens e mesmo as próprias humildes mulheres consideram: como se mulher fizesse parte de uma comunidade fechada, à parte, e de certo modo segregada (...).
LISPECTOR, Clarice. Correio Feminino. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
Indique a alternativa INCORRETA sobre o texto “Me dá licença, minha senhora”:
Me dá licença, minha senhora
Clarice Lispector
Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro exatamente por que disse, mas disse com sinceridade.
Hoje repito: é uma maldição. Mas, maldição que salva. Não estou me referindo muito a escrever para jornal. Mas àquilo que eventualmente pode se transformar em conto ou romance. Ou novela (acabei uma agora).
É uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso, do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação. Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se entende a menos que se escreva.
Escrever é tentar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o fim o que permaneceria apenas vago e sufocador.
Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada. Pena que só sei escrever quando espontaneamente a “coisa” vem. Fico, portanto, à mercê do tempo. E, entre um escrever e outro, passam anos. Anos de carência. (...)
Falei em carência. Pior que carência é o súbito cansaço de tudo. É uma espécie de fartura, parece que já se teve tudo e que não se quer mais nada. Cansaço, por exemplo, dos Beatles. E cansaço também daqueles que não são os Beatles. Cansaço inclusive de minha liberdade íntima que foi tão duramente conquistada. Cansaço de amar um homem e de repente ver que ele não merecia esse amor: ele era grosseiro, arrogante e covarde. Melhor seria o ódio. (...)
Não sou dada a festas. Mas estive numa reunião, pouco antes da morte de Guimarães Rosa. Ele disse que, quando não estava se sentindo bem, quando estava deprimido, relia trechos do que já havia escrito. Espantaram-se os presentes quando eu disse que detesto reler coisas minhas. Alguém observou que o engraçado é que parece que eu não quero ser escritora. De algum modo é verdade, e não sei por quê. Até ser chamada de escritora me encabula. (...)
Guimarães Rosa então me disse uma coisa que jamais esquecerei: disse que me lia “não para a literatura e sim para a vida”. E citou frases e frases minhas, que ele sabia de cor e eu não reconheci nenhuma. Acho que sou mesmo esquisita, mas o que há de se fazer? (...)
Uma vez me ofereceram a oportunidade de fazer uma crônica de comentários sobre acontecimentos, só que essa crônica seria feita para mulheres e a estas dirigidas. Terminou dando em nada a proposta, felizmente. Digo felizmente porque desconfio de que a coluna ia descambar para assuntos estritamente femininos, considerando “feminino” o que geralmente os homens e mesmo as próprias humildes mulheres consideram: como se mulher fizesse parte de uma comunidade fechada, à parte, e de certo modo segregada (...).
LISPECTOR, Clarice. Correio Feminino. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
Assinale V para afirmações verdadeiras e F para as falsas sobre o texto “Me dá licença, minha senhora”:
( ) As posições antagônicas de Guimarães Rosa e Clarice Lispector em relação à releitura dos próprios textos revelam que há modos diferenciados de leitura que decorrem de características biológicas diferentes entre homens e mulheres.
( ) A autora sugere que restringir as mulheres aos temas tradicionalmente tidos como femininos pode ser mais uma forma de dominação masculina.
( ) Guimarães Rosa destituiu os livros de Clarice Lispector de valor artístico quando afirmou que lia tais escritos “não para a literatura, mas para a vida”.
( ) Ao cometer um desvio proposital da norma padrão da escrita, a autora assume no título do texto uma atitude de liberdade de expressão revelada tanto na forma quanto no conteúdo.
( ) O texto ratifica posicionamentos históricos do movimento feminista.
A sequência correta é:
A questão aborda o livro “Água Viva”, de Clarice Lispector
Coloque V para as afirmações verdadeiras e F para as que possuem erros:
( ) A narrativa se distancia do romance típico da segunda geração modernista por adotar como predominante a linguagem lírica, enfatizar a reflexão metalinguística e as questões existenciais.
( ) O(a) narrador(a) assume uma enunciação feminina no início da trama, passa a narrar sob a perspectiva masculina e conclui com a adoção de um ponto de vista neutro (o it da linguagem).
( ) O fluxo de consciência, o apelo excessivo aos elementos sensoriais, as aliterações, os devaneios e as imagens hiperbólicas filiam a narrativa à estética Simbolista.
( ) A linguagem, o tempo, o espaço, o enredo e os personagens se fragmentam, dando destaque para questões subjetivas de quem narra, como é comum em romances de ações internas.
( ) O longo monólogo de “Água Viva”, marcado por profunda angústia e pessimismo, tem por finalidade estabelecer um diálogo com Deus, que se constitui como personagem central do enredo.
A sequência correta é:
A questão aborda o livro “Água Viva”, de Clarice Lispector
Sobre “Água Viva”, pode-se afirmar:
I. Em determinado trecho da narrativa, Clarice Lispector substitui a personagem narradora como voz enunciativa e afirma estar escrevendo uma autobiografia.
II. Animais, vegetais, objetos e humanos são nivelados num mesmo plano existencial, o que chega a conferir uma conotação panteísta a algumas falas da protagonista.
III. Assim como Érica, a protagonista de “Enquanto Deus não está olhando”, de Débora Ferraz, a narradora de “Água Viva” deixa de exercer o ofício de artista plástica para refletir sobre a própria vida, evocar lembranças e superar o luto.
IV. Há um momento de epifania (revelação) no final da trama responsável pela adequação de “Água Viva” ao formato clássico do gênero conto.
V. O monólogo de “Água Viva” é constituído por dezenas de momentos epifânicos da protagonista.
Estão corretas apenas as afirmações
Sobre “Terra de Santa Cruz”, de Adélia Prado, assinale a alternativa INCORRETA.