Além da Imaginação
[1] Imagine um país em que um senador que tinha
as contas de sua amante pagas por uma emprei-
teira, e que perdeu o cargo de presidente da Casa
por esse motivo, é indicado na legislatura seguinte
[5] para integrar o Conselho de Ética do Senado. Ou
seja, para julgar o comportamento de seus pares.
Imagine um país em que outro senador arranca o
gravador das mãos de um jornalista que lhe fez
uma pergunta incômoda, e é apoiado por essa ati-
[10] tude destemperada. Imagine um país em que um
deputado federal semianalfabeto, na mais benigna
das hipóteses, integra a Comissão de Educação e
Cultura da Câmara. Imagine um país em que o
partido atualmente no poder concederá perdão ao
[15] protagonista do maior escândalo de corrupção da
história – e que dá aulas, em seu estado, de Ética
e Política. Imagine um país em que a chefe da Po-
lícia Rodoviária Federal tem a carteira de habilita-
ção apreendida por excesso de multas. Em qual-
[20] quer área, um profissional que comete um deslize
é imediatamente afastado de suas funções e, de-
pendendo da gravidade de seu ato, não volta nun-
ca mais à ativa. Mas isso não ocorre na política
brasileira. Pelo contrário, os mais enrolados são
[25] vistos com admiração pelos seus colegas, como
se professores fossem nas artes da prevaricação
e da impunidade, e assim vão galgando postos na
contramão da decência.
Em todos os níveis da política brasileira, a ética
[30] é afrontada diariamente. Mas em Brasília a situa-
ção alcança o surrealismo. Em setembro de 2003,
VEJA circulou com uma capa que retratava a capi-
tal federal como um pedaço de terra flutuando no
ar, com o título “Brasilha da Fantasia”. Quase oito
[35] anos depois, a lógica de funcionamento da capital
federal continua a ignorar as demandas do país.
Brasília, como mostra a reportagem (...), perma-
nece uma cidade fora do tempo e do espaço, que
mantém códigos (i)morais próprios e nutre um in-
[40] solente desprezo pela opinião pública e pela ética.
Imagine um país, prezado leitor, além da imagina-
ção. Esse é o Brasil político.
(Carta ao Leitor/ Revista Veja, 04 de maio de 2011, p.14)
Nas alternativas a seguir, assinale a única que não encontra suporte no texto.