Precisamos falar sobre depressão e estudos
Segundo a OMS, somos o país mais depressivo da América Latina. A depressão se manifesta em pessoas de diferentes idades, incluindo crianças e jovens. Como lidar com este mal?, principalmente em fases importantes como a de vestibular? Confira mais informações no artigo a seguir.
Recentemente, a dramaturgia de “13 Reasons Why”, série criada e disponível pela netflix.com, despertou uma grande polêmica por abordar o tema da depressão e do suicídio em sua temporada única. Ao mesmo tempo, pesquisas são feitas e indicam um alerta nos últimos anos: precisamos falar sobre a relação entre depressão e estudos. Segundo dados divulgados no relatório “Depressão e outros distúrbios mentais comuns: estimativas globais de saúde”, publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em fevereiro de 2017, 5,8% da população do Brasil sofre com a doença, o que corresponde a 11,5 milhões de pessoas.
Muita gente confunde a depressão, que é uma patologia, com alterações de humores rotineiras, consideradas comuns, considerados os desafios que envolvem nossas vidas e cotidianos. A depressão é muito grave e pode levar a problemas mais sérios, como a incapacidade social, a dependência química e, em casos mais profundos, até à morte por meio do suicídio. Neste artigo, vamos falar sobre esse tema que é considerado, a cada dia, mais necessário. Você vai saber um pouco sobre o panorama da doença, suas características e sintomas, o que pode ser feito para se prevenir, e como ela pode (e deve) ser diagnosticada e tratada.
Afinal, o que é depressão?
Como dissemos, existe uma confusão comum quando se tenta definir o que é a depressão. Isso porque a doença pode ser confundida com uma simples tristeza, por exemplo. Mas, o professor titular do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (USP), José Alberto Del Porto, em artigo publicado pela Revista Brasileira de Psiquiatria, nos auxilia em uma explicação mais detalhada. Vamos vê-las a seguir, moçada:
Depressão enquanto sintoma: pode surgir nos mais variados quadros clínicos, como traumas, doenças e pode ainda ocorrer como resposta a situações estressantes, ou a circunstâncias sociais e econômicas adversas.
Depressão enquanto síndrome: inclui não apenas alterações do humor (tristeza, irritabilidade, falta da capacidade de sentir prazer, indiferença), mas também alterações de aprendizagem.
Depressão enquanto doença: tem sido classificada de várias formas, na dependência do período histórico, da preferência dos autores e do ponto de vista adotado. Entre os quadros mencionados na literatura atual encontram-se: transtorno depressivo maior, melancolia, distimia, depressão integrante do transtorno bipolar tipos I e II, depressão como parte da ciclotimia, etc.
Embora boas explicações, como a citada acima, pareçam nos esclarecer mais sobre a temática, “nem todos os pacientes relatam a sensação subjetiva de tristeza. Muitos referem, sobretudo, a perda da capacidade de experimentar prazer nas atividades em geral e a redução do interesse pelo ambiente. Frequentemente associa-se à sensação de fadiga ou perda de energia, caracterizada pela queixa de cansaço exagerado”, conforme também cita o professor.
Essa “sensação subjetiva de tristeza” a que o pesquisador se refere é o conceito do que nós, cidadão construídos ideológica e socialmente, trazemos com a gente desde nossa infância. A imagem do choro, do desespero, da prostração, que vem de primeira à mente, nem sempre condizem com a realidade.Por isso, é bom lembrar que cada situação precisa de acompanhamento de um profissional capacitado a afirmar algo de forma precisa e a auxiliar no que pode ser feito para o tratamento. Profissional, galera, ok? Não é benzedor, não é superstição, nem mulher de oração, all right?
Panorama geral
Ao todo, 322 milhões de pessoas convivem com a depressão no mundo. Esse número também é do relatório global lançado pela OMS ano passado, que aponta a maioria dos depressivos como sendo mulheres, além do crescimento de 18% dos casos entre os anos 2005 e 2015.
A ausência de informações, a não capacitação profissional adequada e o estigma que ainda é associado à doença são alguns dos principais fatores que dificultam o diagnóstico e, por isso também, o tratamento. Mesmo que soluções eficientes para tratar a depressão existam, a pesquisa da OMS ainda relata que menos da metade das pessoas que vivem com a doença são tratadas.
Características e sintomas
Entre os sinais mais comuns, que se dividem entre psíquicos e fisiológicos, segundo o professor José Alberto, são: 1) humor depressivo: sensação de tristeza, autodesvalorização e sentimentos de culpa. 2) a redução da capacidade de experimentar prazer na maior parte das atividades, antes consideradas como agradáveis. 3) - Fadiga ou sensação de perda de energia. As tarefas mais leves parecem exigir esforço substancial. 4) - Diminuição da capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões. Decisões antes quase automáticas parecem agora custar esforços intransponíveis.
Além disso, sintomas fisiológicos também podem ocorrer, como alterações do sono (mais freqüentemente insônia, podendo ocorrer também hipersonolência) e alterações do apetite. Em alguns casos, acontece o aumento do apetite, que se mostra caracteristicamente aguçado por carboidratos e doces.
A depressão e os estudos
“Tomo remédio controlado desde os doze anos, não consigo dormir mais que seis horas por dia e vez ou outra, se não me cuido, me sinto para baixo e inerte, além de me sentir desmotivada na maior parte do tempo” Marcella tem dezoito anos, mora em Curitiba-PR. A estudante vive com transtorno de ansiedade e sofre com episódios depressivos, que se agravaram desde que chegou à fase de pré-vestibulanda. “Sempre sonhei em fazer medicina e não aceito uma faculdade além da instituição federal, sou muito perfeccionista, quero dar orgulho aos meus pais e me formar da melhor maneira possível. Acredito que lá (na federal) vou conseguir as duas coisas”, completa.
Se os vestibulandos lidam com grande ansiedade com o vestibular, a vida na faculdade, infelizmente, não é mais tranquila. Um recente estudo, nomeado “Problemas de saúde mental em estudantes de medicina no Brasil: revisão sistemática e meta-análise.”, concluiu um alto índice de transtornos psicológicos neste grupo de estudantes, como a ansiedade, a depressão e o uso de álcool. O estudo acompanhou 18 mil estudantes de medicina brasileiros e foi divulgado pela Revista Brasileira de Psiquiatria em 2017.
Segundo João Pedro Gonçalves Pacheco, médico em formação pela Faculdade de Medicina da Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (EMESCAM) o projeto nasceu quando a notícia sobre o suicídio de uma estudante de medicina viralizou no Facebook. Em entrevista ao portal Medscape, o pesquisador disse que os dados do estudo “põem em evidência que o transtorno mais prevalente entre os estudantes de medicina brasileiros é a ansiedade, com uma prevalência 32,9% (...) e encontramos também uma prevalência alta de uso problemático de álcool: 32,9%, e de depressão: 30,6%."
É muito provável que você já tenha ouvido histórias parecidas com o relato de Marcella ou que condizem com os números apontados pelo estudo que João participou. Afinal, esse período da vida, que separa a escola da faculdade, ou a faculdade da realização profissional, tende a ser um pouco conturbado para a maior partes dos alunos. E não é só no universo da concorrência do mundo da Medicina que a realidade se aplica, basta observarmos o uso da própria palavra “depressão” em nosso dia a dia aumentou nos últimos anos, a palavra está presente em coisas corriqueiras, aparece em nomes de páginas de sucesso no Facebook, como “Graduação da depressão”, “SP da depressão”, por exemplo.
“Mais do que triste: a depressão afeta sua capacidade de pensar”, um outro estudo divulgado pela Universidade de Harvard, em março de 2016, concluiu que a depressão pode alterar a nossa capacidade de pensar, pode reduzir a nossa atenção e memória, além de afetar as nossas habilidades de registrar informações e de tomar decisões. A pesquisa foi feita com 1.000 pessoas depressivas em tratamento e também indicou que a doença pode encurtar a flexibilidade cognitiva, ou seja, a eficácia de adaptação de objetivos e estratégias a situações de mudança, e a capacidade de executar todas as etapas para realizar alguma meta.
Após alguns exemplos mais ligados à prática, fica mais claro a relação que os estudos têm com essa doença que toma, a cada dia, mais espaço em nossas discussões. A depressão está ligada a basicamente quase todos os recursos que usamos para a prática dos estudos, por isso, é preciso cuidado com a nossa saúde mental e física, ainda que os estudos e as expectativas sempre queiram nos “puxar” para o agora, é preciso cautela e muita reflexão sobre o depois.
Prevenção e como pode ser tratada
Como vimos, os quadros e sintomas podem se diferenciar e variam de pessoa para pessoa, conforme a intensidade, chegando aos estágios de temporários, crônicos ou perenes. Naturalmente, torna-se complexo delimitar de forma precisa uma causa única que resulta em um estado depressivo. Fatores biológicos, sociais e psicológicos se interrelacionam diariamente em nossas vidas, por isso, é mais seguro dizer que um conjunto de acontecimentos pode desencadear em uma situação depressiva. É claro que as pessoas que tiveram episódios tristes recentes, como traumas, perda de emprego, de parentes queridos, falta de boas condições de vida, etc, têm mais tendências de desenvolver o quadro clínico.
Para prevenção, existem algumas medidas que podemos tomar por nós mesmos, como: pensamento positivo, exercícios de agradecimento diário, compartilhamento de problemas em um grupo de amigos, alimentação saudável e prática regular de alguma atividade física, foco em valorizar as pequenas conquistas e busca por superação das perdas, entre outros. Essas são medidas que ajudam a prevenir, o auxílio psicológico continua sendo a forma mais eficaz de se lidar com o problema.
A primeira coisa a se fazer quando há suspeita de depressão é: compartilhar esse sentimento com alguém: amigos, família, o pessoal da escola. É muito importante saber que não estamos sozinhos e que não devemos ter vergonha dessa condição. Afinal, com o modelo de vida que levamos hoje, estamos muitos suscetíveis a nos sentirmos sós, despreparados para o mundo, desqualificados, entre outros sentimentos downs que um domingo à tarde solitário pode retomar a qualquer momento. Somos humanos, não devemos ter constrangimento dessa condição. Mas, se a situação persistir, é preciso cuidado.
Depois de se abrir para a possível condição, é imprescindível buscar ajuda profissional capacitada. Alguns planos de saúde cobrem tratamento terapêutico em até 100% dos casos, outros em parte, mas, para quem não possui, existem os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e as Unidades Básicas de Saúde (UBS), que disponibilizam psicólogos e psiquiatras, ou enfermeiros especializados na área mental, aptos para lidar com problemas psicológicos.
O tratamento vai se diferenciar de caso para caso, mas pode ser feito via terapia cognitivo-comportamental, ativação comportamental, terapia em grupo ou individual, ou mesmo com o uso de medicamentos antidepressivos. A utilização destes últimos é restrita a casos mais graves, e ela não é a primeira opção de tratamento, e seu uso deve ser acompanhado de perto por profissionais que saberão lidar com os possíveis efeitos colaterais.
Ninguém quer ter depressão, ninguém que se sentir só e incapaz, mas, infelizmente, isso pode acontecer. E pode coincidir de ser justamente na fase em que estamos nos dedicando a uma das coisas que mais damos valor na vida: nossa formação. Mas, se a notícia ruim é que a depressão existe, a boa é que tem tratamento e que sempre existe esperança de melhoria de qualidade de vida enquanto a gente tiver vivo.
Além dos órgãos capacitados que citamos, existe um trabalho muito legal, o do Centro de Valorização da Vida (CVV), um canal que realiza apoio emocional e prevenção do suicídio. A iniciativa atende gratuitamente todas as pessoas que queiram e precisam conversar por telefone, email, chat e voip, 24 horas, todos os dias e sob total sigilo. Se você está se sentindo acanhado de conversar sobre o assunto com alguém, é só discar 188 e pode contar também com esse help.
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Lucas Lemos
Redator, social mídia, pesquisador e entusiasta das artes pelo Cena Livre de Teatro, grupo atuante na UFMT. Aluno do terceiro ano de Letras-Literatura na instituição federal, e fotógrafo nas horas vagas.
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