Questões de Literatura - Teoria literária
Texto
Da solidão
Há muitas pessoas que sofrem do mal da solidão.
Basta que em redor delas se arme o silêncio, que não se
manifeste aos seus olhos nenhuma presença humana, para
que delas se apodere imensa angústia: como se o peso do
[5] céu desabasse sobre sua cabeça, como se dos horizontes
se levantasse o anúncio do fim do mundo.
No entanto, haverá na terra verdadeira solidão?
Não estamos todos cercados por inúmeros objetos, por
infinitas formas da Natureza e o nosso mundo particular
[10] não está cheio de lembranças, de sonhos, de raciocínios,
de ideias, que impedem uma total solidão?
Tudo é vivo e tudo fala, em redor de nós, embora
com vida e voz que não são humanas, mas que podemos
aprender a escutar, porque muitas vezes essa linguagem
[15] secreta ajuda a esclarecer o nosso próprio mistério. Como
aquele Sultão Mamude, que entendia a fala dos pássaros,
podemos aplicar toda a nossa sensibilidade a esse
aparente vazio de solidão: e pouco a pouco nos sentiremos
enriquecidos.
[20] Pintores e fotógrafos andam em volta dos objetos
à procura de ângulos, jogos de luz, eloquência de formas,
para revelarem aquilo que lhes parece não só o mais
estático dos seus aspectos, mas também o mais
comunicável, o mais rico de sugestões, o mais capaz de
[25] transmitir aquilo que excede os limites físicos desses
objetos, constituindo, de certo modo, seu espírito e sua
alma.
Façamo-nos também desse modo videntes:
olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das
[30] cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos
tecidos sem maiores pretensões. Não procuremos neles a
beleza que arrebata logo o olhar, o equilíbrio de linhas, a
graça das proporções: muitas vezes seu aspecto – como o
das criaturas humanas – é inábil e desajeitado. Mas não é
[35] isso que procuramos, apenas: é o seu sentido íntimo que
tentamos discernir. Amemos nessas humildes coisas a
carga de experiências que representam, e a repercussão,
nelas sensível, de tanto trabalho humano, por infindáveis
séculos.
[40] Amemos o que sentimos de nós mesmos, nessas
variadas coisas, já que, por egoístas que somos, não
sabemos amar senão aquilo em que nos encontramos.
Amemos o antigo encantamento dos nossos olhos infantis,
quando começavam a descobrir o mundo: as nervuras das
[45] madeiras, com seus caminhos de bosques e ondas e
horizontes; o desenho dos azulejos; o esmalte das louças;
os tranquilos, metódicos telhados... Amemos o rumor da
água que corre, os sons das máquinas, a inquieta voz dos
animais, que desejaríamos traduzir.
[50] Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever
de amor aplicarmos o ouvido, a vista, o coração a essa
infinidade de formas naturais ou artificiais que encerram
seu segredo, suas memórias, suas silenciosas experiências.
A rosa que se despede de si mesma, o espelho onde pousa
[55] o nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos
de quem dorme, tudo, tudo é um mundo com passado,
presente, futuro, pelo qual transitamos atentos ou
distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com
violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso
[60] respeito; que espera que o descubramos, sem anunciar
nem pretender prevalecer; que pode ficar para sempre
ignorado, sem que por isso deixe de existir; que não faz da
sua presença um anúncio exigente " Estou aqui! estou
aqui! ". Mas, concentrado em sua essência, só se revela
[65] quando os nossos sentidos estão aptos para descobrirem.
E que em silêncio nos oferece sua múltipla companhia,
generosa e invisível.
Oh! se vos queixais de solidão humana, prestai
atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a
[70] essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que
conversará convosco interminavelmente.
MEIRELES, Cecília. Da solidão. In: MEIRELES, Cecília. Janela Mágica. São Paulo: Global, 2016, pp. 71-74.
No texto, o eu lírico demonstra sentir-se
Texto
Da solidão
Há muitas pessoas que sofrem do mal da solidão.
Basta que em redor delas se arme o silêncio, que não se
manifeste aos seus olhos nenhuma presença humana, para
que delas se apodere imensa angústia: como se o peso do
[5] céu desabasse sobre sua cabeça, como se dos horizontes
se levantasse o anúncio do fim do mundo.
No entanto, haverá na terra verdadeira solidão?
Não estamos todos cercados por inúmeros objetos, por
infinitas formas da Natureza e o nosso mundo particular
[10] não está cheio de lembranças, de sonhos, de raciocínios,
de ideias, que impedem uma total solidão?
Tudo é vivo e tudo fala, em redor de nós, embora
com vida e voz que não são humanas, mas que podemos
aprender a escutar, porque muitas vezes essa linguagem
[15] secreta ajuda a esclarecer o nosso próprio mistério. Como
aquele Sultão Mamude, que entendia a fala dos pássaros,
podemos aplicar toda a nossa sensibilidade a esse
aparente vazio de solidão: e pouco a pouco nos sentiremos
enriquecidos.
[20] Pintores e fotógrafos andam em volta dos objetos
à procura de ângulos, jogos de luz, eloquência de formas,
para revelarem aquilo que lhes parece não só o mais
estático dos seus aspectos, mas também o mais
comunicável, o mais rico de sugestões, o mais capaz de
[25] transmitir aquilo que excede os limites físicos desses
objetos, constituindo, de certo modo, seu espírito e sua
alma.
Façamo-nos também desse modo videntes:
olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das
[30] cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos
tecidos sem maiores pretensões. Não procuremos neles a
beleza que arrebata logo o olhar, o equilíbrio de linhas, a
graça das proporções: muitas vezes seu aspecto – como o
das criaturas humanas – é inábil e desajeitado. Mas não é
[35] isso que procuramos, apenas: é o seu sentido íntimo que
tentamos discernir. Amemos nessas humildes coisas a
carga de experiências que representam, e a repercussão,
nelas sensível, de tanto trabalho humano, por infindáveis
séculos.
[40] Amemos o que sentimos de nós mesmos, nessas
variadas coisas, já que, por egoístas que somos, não
sabemos amar senão aquilo em que nos encontramos.
Amemos o antigo encantamento dos nossos olhos infantis,
quando começavam a descobrir o mundo: as nervuras das
[45] madeiras, com seus caminhos de bosques e ondas e
horizontes; o desenho dos azulejos; o esmalte das louças;
os tranquilos, metódicos telhados... Amemos o rumor da
água que corre, os sons das máquinas, a inquieta voz dos
animais, que desejaríamos traduzir.
[50] Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever
de amor aplicarmos o ouvido, a vista, o coração a essa
infinidade de formas naturais ou artificiais que encerram
seu segredo, suas memórias, suas silenciosas experiências.
A rosa que se despede de si mesma, o espelho onde pousa
[55] o nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos
de quem dorme, tudo, tudo é um mundo com passado,
presente, futuro, pelo qual transitamos atentos ou
distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com
violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso
[60] respeito; que espera que o descubramos, sem anunciar
nem pretender prevalecer; que pode ficar para sempre
ignorado, sem que por isso deixe de existir; que não faz da
sua presença um anúncio exigente " Estou aqui! estou
aqui! ". Mas, concentrado em sua essência, só se revela
[65] quando os nossos sentidos estão aptos para descobrirem.
E que em silêncio nos oferece sua múltipla companhia,
generosa e invisível.
Oh! se vos queixais de solidão humana, prestai
atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a
[70] essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que
conversará convosco interminavelmente.
MEIRELES, Cecília. Da solidão. In: MEIRELES, Cecília. Janela Mágica. São Paulo: Global, 2016, pp. 71-74.
O recurso que classifica o texto como uma crônica é a
Os movimentos literários tiveram início, no Brasil, durante o século XVI e são divididos em dois grandes momentos: a era colonial e a era nacional. Esses dois períodos ficaram marcados e separados pela emancipação política do Brasil. Relacione as assertivas ao movimento correspondente.
1. Barroco
2. Arcadismo
3. Romantismo
4. Realismo/Naturalismo
5. Parnasianismo
( ) Esse movimento propõe conectar o homem à natureza por meio da arte. Sua essência baseia-se no resgate da Antiguidade clássica, que não separava a arte da técnica. O processo não estaria ligado diretamente à habilidade, mas ao saber fazer.
( ) Com enfoque no ser humano e no seu cotidiano, na crítica social, com linguagem simples e objetiva cujos personagens e ambientes são descritos de forma detalhada, iniciou oficialmente em 1881, com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de seu mais célebre autor, Machado de Assis.
( ) É marcado pela expressão e pela valorização dos sentimentos, com destaque para a dualidade entre o amor e o sofrimento. A liberdade de criação se mistura à fantasia. As marcas principais são sentimentalismo, supervalorização das emoções pessoais, subjetivismo e egocentrismo.
( ) Em meio a um período em que a arte ganha espaço, esse movimento literário estimulou o ser humano a redescobrir a fé. Os textos refletem elementos rebuscados e quase sempre extravagantes, em que são valorizados os detalhes em jogo de contrastes.
( ) Movimento literário que iniciou na França, em meados do século XIX, com o objetivo de produzir “poesias perfeitas”, valorizando a forma e a linguagem culta, criticando o sentimentalismo. A objetividade, a valorização da metrificação e a presença de impessoalidade também fazem parte de suas principais características.
A sequência correta é
Texto 1
Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do sol em vão se atreve;
Papoila ou rosa delicada e fina
Te cobre as faces que são cor da neve.
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamo vapora.
Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para glória de Amor igual Tesouro.
Graças, Marília bela,
Graças à minha estrela!
Gonzaga, T. Antônio. Marília de Dirceu e Cartas Chilenas. São Paulo: Ática,1997, p.12
Texto 2
Saudosamente sentido na ausência da dama a quem o autor muito amava
Entre (ó Floralva) assombros repetidos
É tal a pena, com que vivo ausente,
Que palavra a voz me não consente,
E só para sentir me dá sentidos.
Nos prantos, e nos ais enternecidos,
Dizer não pode o peito o mal que sente;
Pois vai confusa a queixa na corrente,
E mal articulada nos gemidos.
Se para o meu tormento conheceres
Não bastar o sutil discurso vosso,
A dor me não permite outros poderes.
Vede nos prantos, e ais o meu destroço;
E entendei vós o mal como quiserdes,
Que eu só sei explicá-lo como posso.
MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos. São Paulo: Cultrix, 2004, p.202.
A partir dos dois poemas, assinale a alternativa correta.
“Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeumas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: - Não, perdão, meu senhor; meu senhor, perdão! - Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova.
- Toma, diabo! - dizia ele; toma mais perdão, bêbado!
- Meu senhor! - gemia o outro.
- Cala a boca, besta! - replicava o vergalho.
Parei, olhei...
Justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio - o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a bênção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele.
- É, sim, nhonhô.
- Fez-te alguma coisa?
- É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.
- Está bom, perdoa-lhe – disse eu.
- Pois, não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!”
ASSIS, Machado. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: FTD, 1991, p. 111.
A partir do fragmento e da obra Memórias póstumas de Brás Cubas, avalie as assertivas a seguir.
I - Esse trecho exemplifica o comportamento agressivo de homens que eram escravos de grandes senhores, conforme o espírito de romances naturalistas no qual essa obra está inserida.
II - Prudêncio ostenta como proprietário (senhor) de um escravo. Entretanto, ao obedecer à ordem de Brás Cubas, seu antigo carrasco, Prudêncio retorna à condição de submisso da qual não havia saído. Ele demonstra não ter sido preparado para assumir o novo regime de vida com liberdade.
III - Ao espancar o escravo com violenta tirania, após ter sido alforriado, Prudêncio repete em outro preto o mesmo sofrimento pelo qual ele passara, antes de liberto, e seu comportamento revela ser o reflexo do sistema escravocrata praticado no Brasil.
É correto o que se afirma em
Leia o soneto “Descreve o que era naquele tempo a cidade da Bahia”, do poeta Gregório de Matos (1636-1696), para responder à questão.
A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.
Em cada porta um bem frequente olheiro,
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
Para o levar à praça e ao terreiro.
Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres¹,
Posta nas palmas toda a picardia,
Estupendas usuras nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres:
E eis aqui a cidade da Bahia.
(Gregório de Matos. Poemas escolhidos, 2010.)
1Trazidos sob os pés os homens nobres: na visão de Gregório de Matos, os mulatos em ascensão subjugam com esperteza os verdadeiros “homens nobres”.
O soneto de Gregório de Matos constitui um exemplo da sua poesia de teor