Questões de Literatura - Vanguardas europeias
59 Questões
Leia o poema em prosa “Conto cruel”, de Mário Quintana, para responder à questão
Conto cruel
I
De repente, o leite talhou nos vasilhames. Foi um raio? Foi Leviatã? Foi o quê?
O burgomestre1, debaixo das cobertas, resfolegava orações meio esquecidas.
E os negros monstros das cornijas2, com as faces zebradas de relâmpagos, silenciosamente gargalhavam por suas três ou quatro bocas superpostas.
II
E amanheceu um enorme ovo, em pé, no meio da praça, três palmos mais alto que os formosos alabardeiros3 que lhe puseram em torno para evitar a aproximação do público. Foi chamado então o velho mágico, que escreveu na casca as três palavras infalíveis. E o ovo abriu-se ao meio e dele saiu um imponente senhor, tão magnificamente vestido e resplandecente de alamares e crachás que todos pensaram que fosse o Rei de Ouros. E ei-lo que disse, encarando o seu povo: “Eu sou o novo burgomestre!” Dito e feito. Nunca houve tanta dança e tanta bebedeira na cidade. Quanto ao velho burgomestre, nem foi preciso depô-lo, pois desapareceu tão misteriosamente como havia aparecido o novo, ou o ovo. E os menestréis compuseram divertidas canções, que o populacho berrava nas estalagens, entre gargalhadas e arrepios de medo.
III
Mas por onde andaria o burgomestre?
O seu cachimbo de porcelana, em cujo forno se via um Cupido de pernas trançadas, tocando flauta, foi encontrado à beira-rio. E apesar de todos os esforços, só conseguiram pescar um baú, que não tinha nada a ver com a coisa, e uma sereiazinha insignificante e nada bonita, uma sereiazinha de água doce, que nem sabia cantar e foi logo devolvida ao seu elemento.
Mas quando casava a filha do mestre-escola, encontrou- -se dentro do bolo de noiva a dentadura postiça do burgomestre, o que deu azo a que desmaiassem, no ato, duas gerações inteiras de senhoras, e ao posterior suicídio do pasteleiro.
E a caixa de rapé do burgomestre, que era inconfundível e única, multiplicou-se estranhamente e começou a ser achada em todas as salas de espera desertas, pelos varredores verdes de terror, depois que era encerrado o expediente nas repartições públicas e começava a ouvir-se, na rua, o passo trôpego do acendedor de lampiões.
(Melhores poemas, 2005.)
1 burgomestre: prefeito.
2 cornija: moldura sobreposta, formando saliências, que arremata a parte
superior de uma parede, porta.
3 alabardeiro: soldado armado de alabarda (antiga arma composta de longa
haste, que é rematada por peça pontiaguda de ferro).
A presença do elemento onírico no poema de Mario Quintana revela a influência, sobretudo, da seguinte vanguarda europeia:
Essa vanguarda baseia-se na crença na realidade superior das formas específicas de associação, antes negligenciadas, na onipotência dos sonhos e no jogo desinteressado do pensamento. André Breton, seu principal teórico, afirmou que o propósito dessa vanguarda era “resolver a contradição até agora vigente entre sonho e realidade pela criação de uma realidade absoluta, uma supra-realidade.”
(Ian Chilvers (org.). Dicionário Oxford de arte, 2007. Adaptado.)
O texto trata de uma vanguarda que influenciou inúmeros escritores do Modernismo brasileiro, qual seja,
Nós cantaremos as grandes multidões movimentadas pelo trabalho [...]; a vibração noturna dos arsenais e dos estaleiros sob suas violentas luas elétricas; [...] as usinas suspensas nas nuvens pelos barbantes de suas fumaças; [...] as locomotivas de grande peito, [...] como enormes cavalos de aço.
(Filippo Tommaso Marinetti. “Manifesto do Futurismo”. In: Gilberto M. Teles. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro, 1986.)
O Manifesto do Futurismo foi publicado, pela primeira vez, no jornal francês Le Figaro, em 20 de fevereiro de 1909.
Observa-se, pela leitura do excerto, que o Futurismo enaltecia a experiência humana produzida
As vanguardas europeias foram movimentos pioneiros, precursores dos “modernismos” que se expandiram no mundo ocidental no século XX. No que diz respeito ao Modernismo Brasileiro, a estética surrealista influenciou poetas como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Aníbal Machado, Murilo Mendes.
São características do Surrealismo, como movimento de vanguarda,
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.
5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
6. E preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e munificiência, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
MARINETTI, F. T. Manifesto futurista. In: TELES, G. M. Vanguardas europeias e Modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1985.
O documento de Marinetti, de 1909, propõe os referenciais estéticos do Futurismo, que valorizam a
A pintura do artista brasileiro utiliza elementos
de estética de uma das Vanguardas Europeias,
a saber o
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