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Questão 10 985252
UERJ 2020/1CIVILIZAÇÃO
A matéria saiu no New York Times, foi publicada na Folha de São Paulo; deveria ser bibliografia
obrigatória do ensino fundamental à pós-graduação, deveria ser colada aos postes, lançada de aviões,
viralizada nas redes sociais, impressa em santinhos, guardada na carteira, no bolso ou no sutiã e lida
toda vez que a desilusão, o desespero, a melancolia ou mesmo o tédio batesse na porta, batesse na aorta:
[5] “Para salvar Stradivarius, uma cidade inteira fica em silêncio”.
Antonio Stradivari viveu entre 1644 e 1737 em Cremona, norte da Itália, cidadezinha que hoje
conta com 72267 habitantes. Durante algumas décadas dos séculos XVII e XVIII, Stradivari
produziu instrumentos de corda, como violinos, cujos sons quase quatro séculos de conhecimento
acumulado não foram capazes de igualar.
[10] Por muito tempo permaneceu um mistério o que fazia aqueles instrumentos tão diferentes dos
demais, fabricados antes ou depois. Estudos recentes, porém, mostraram que, para além da artesania
magistral do luthier*, um tratamento químico dado à madeira, à época da fabricação, interfere na
qualidade do som dos instrumentos.
O tempo de uso também entra na equação: a secura da madeira e a distância entre as fibras, causada
[15] pela oxidação, são razões pelas quais, segundo o dr. Hwan-Ching Tai, autor de um estudo de 2016,
“esses velhos violinos vibram mais livremente, o que permite a eles expressar uma gama mais ampla
de emoções”.
Se é verdade que os violinos Stradivarius, como muitos vinhos, melhoraram com o tempo, é
inexorável que, em algum momento, avinagrem. Pois esse momento se aproxima: depois de quase
[20] quatrocentos anos espalhando a melhor música que já foi ouvida, os violinos, violoncelos e violas
de Cremona estão atingindo seu limite. Logo estarão frágeis demais para serem tocados e serão,
segundo Fausto Cacciatori, curador do Museu do Violino de Cremona, “colocados para dormir”.
Antecipando-se ao sono derradeiro, os moradores de Cremona criaram o Projeto Stradivarius. “Por
cinco semanas, quatro músicos, tocando dois violinos, uma viola e um violoncelo, farão centenas de
[25] escalas e arpejos, usando técnicas diferentes com arcos, ou dedilhando as cordas”, sob “trinta e dois
microfones de alta sensibilidade”. Três engenheiros de som, trancados num quartinho à prova de
qualquer ruído, no auditório do museu, gravarão cada uma das centenas de milhares de variações
sonoras, de modo que, no futuro, será possível compor músicas com o som dos Stradivarius.
O projeto já estava quase saindo do papel em 2017 quando os idealizadores perceberam que o barulho
[30] em torno do museu impossibilitaria as gravações. O prefeito de Cremona, então, permitiu que as ruas
da região fossem fechadas até que a última nota fosse imortalizada. A cidade calou-se e os Stradivarius
começaram a cantar.
Até meados de fevereiro, os 72267 moradores da cidadezinha italiana deixarão de buzinar suas
lambretas, “nonas” evitarão gritar às janelas e amigos cochicharão pelas mesas dos cafés para que
[35] daqui a quatrocentos anos um garoto em Cremona, Mumbai ou Reykjavik possa compor uma
música com as notas únicas e inimitáveis saídas de instrumentos feitos à mão por um homem
que morreu quase um milênio antes de esse garoto nascer. Acho que é disso que estamos falando
quando falamos em civilização.
ANTONIO PRATA
Adaptado de www1.folha.uol.com.br, 27/01/2019.
* Luthier: profissional especializado em instrumentos de cordas.
A matéria saiu no New York Times, foi publicada na Folha de São Paulo; deveria ser bibliografia obrigatória do ensino fundamental à pós-graduação, deveria ser colada aos postes, lançada de aviões, viralizada nas redes sociais, impressa em santinhos, (l. 1-3)
Com base no trecho acima, é possível reconhecer que, para o autor, o conteúdo da notícia comentada se caracteriza por:
Questão 12 985264
UERJ 2020/1CIVILIZAÇÃO
A matéria saiu no New York Times, foi publicada na Folha de São Paulo; deveria ser bibliografia
obrigatória do ensino fundamental à pós-graduação, deveria ser colada aos postes, lançada de aviões,
viralizada nas redes sociais, impressa em santinhos, guardada na carteira, no bolso ou no sutiã e lida
toda vez que a desilusão, o desespero, a melancolia ou mesmo o tédio batesse na porta, batesse na aorta:
[5] “Para salvar Stradivarius, uma cidade inteira fica em silêncio”.
Antonio Stradivari viveu entre 1644 e 1737 em Cremona, norte da Itália, cidadezinha que hoje
conta com 72267 habitantes. Durante algumas décadas dos séculos XVII e XVIII, Stradivari
produziu instrumentos de corda, como violinos, cujos sons quase quatro séculos de conhecimento
acumulado não foram capazes de igualar.
[10] Por muito tempo permaneceu um mistério o que fazia aqueles instrumentos tão diferentes dos
demais, fabricados antes ou depois. Estudos recentes, porém, mostraram que, para além da artesania
magistral do luthier*, um tratamento químico dado à madeira, à época da fabricação, interfere na
qualidade do som dos instrumentos.
O tempo de uso também entra na equação: a secura da madeira e a distância entre as fibras, causada
[15] pela oxidação, são razões pelas quais, segundo o dr. Hwan-Ching Tai, autor de um estudo de 2016,
“esses velhos violinos vibram mais livremente, o que permite a eles expressar uma gama mais ampla
de emoções”.
Se é verdade que os violinos Stradivarius, como muitos vinhos, melhoraram com o tempo, é
inexorável que, em algum momento, avinagrem. Pois esse momento se aproxima: depois de quase
[20] quatrocentos anos espalhando a melhor música que já foi ouvida, os violinos, violoncelos e violas
de Cremona estão atingindo seu limite. Logo estarão frágeis demais para serem tocados e serão,
segundo Fausto Cacciatori, curador do Museu do Violino de Cremona, “colocados para dormir”.
Antecipando-se ao sono derradeiro, os moradores de Cremona criaram o Projeto Stradivarius. “Por
cinco semanas, quatro músicos, tocando dois violinos, uma viola e um violoncelo, farão centenas de
[25] escalas e arpejos, usando técnicas diferentes com arcos, ou dedilhando as cordas”, sob “trinta e dois
microfones de alta sensibilidade”. Três engenheiros de som, trancados num quartinho à prova de
qualquer ruído, no auditório do museu, gravarão cada uma das centenas de milhares de variações
sonoras, de modo que, no futuro, será possível compor músicas com o som dos Stradivarius.
O projeto já estava quase saindo do papel em 2017 quando os idealizadores perceberam que o barulho
[30] em torno do museu impossibilitaria as gravações. O prefeito de Cremona, então, permitiu que as ruas
da região fossem fechadas até que a última nota fosse imortalizada. A cidade calou-se e os Stradivarius
começaram a cantar.
Até meados de fevereiro, os 72267 moradores da cidadezinha italiana deixarão de buzinar suas
lambretas, “nonas” evitarão gritar às janelas e amigos cochicharão pelas mesas dos cafés para que
[35] daqui a quatrocentos anos um garoto em Cremona, Mumbai ou Reykjavik possa compor uma
música com as notas únicas e inimitáveis saídas de instrumentos feitos à mão por um homem
que morreu quase um milênio antes de esse garoto nascer. Acho que é disso que estamos falando
quando falamos em civilização.
ANTONIO PRATA
Adaptado de www1.folha.uol.com.br, 27/01/2019.
* Luthier: profissional especializado em instrumentos de cordas.
Acho que é disso que estamos falando quando falamos em civilização. (l. 37-38)
O termo “disso” se refere a praticamente toda a crônica de Antonio Prata e pode ser resumido como o esforço da comunidade para:
Questão 13 987274
UERJ 2020/1O CONTO A SEGUIR FOI RETIRADO DO LIVRO HORA DE ALIMENTAR SERPENTES, DE MARINA COLASANTI.
CENA ANTIGA
Amanhece o dia entre neblinas, quando o Bem e o Mal se encontram para mais um duelo.
Escolhem as armas nos estojos, aproximam-se para o encontro ritual, encaram-se. Os padrinhos
que aguardam ao lado do campo, escuros como as gralhas que saltitam entre restolhos, são instados
a partir. Que não haja testemunhas.
[5] Afastados estes, Bem e Mal guardam as armas, se envolvem em suas capas e caminham até a taverna
mais próxima. Ali, frente a canecos cheios, discutirão estratégias e trocarão conselhos durante dias
ou séculos, até o próximo duelo.
No conto de Marina Colasanti, Bem e Mal são ideias personificadas.
Essa personificação é identificada pela narração de:
Questão 14 987276
UERJ 2020/1O CONTO A SEGUIR FOI RETIRADO DO LIVRO HORA DE ALIMENTAR SERPENTES, DE MARINA COLASANTI.
CENA ANTIGA
Amanhece o dia entre neblinas, quando o Bem e o Mal se encontram para mais um duelo.
Escolhem as armas nos estojos, aproximam-se para o encontro ritual, encaram-se. Os padrinhos
que aguardam ao lado do campo, escuros como as gralhas que saltitam entre restolhos, são instados
a partir. Que não haja testemunhas.
[5] Afastados estes, Bem e Mal guardam as armas, se envolvem em suas capas e caminham até a taverna
mais próxima. Ali, frente a canecos cheios, discutirão estratégias e trocarão conselhos durante dias
ou séculos, até o próximo duelo.
O título “Cena antiga” alude à repetição de um ritual, evidenciada pelo seguinte trecho:
Questão 15 987277
UERJ 2020/1O CONTO A SEGUIR FOI RETIRADO DO LIVRO HORA DE ALIMENTAR SERPENTES, DE MARINA COLASANTI.
CENA ANTIGA
Amanhece o dia entre neblinas, quando o Bem e o Mal se encontram para mais um duelo.
Escolhem as armas nos estojos, aproximam-se para o encontro ritual, encaram-se. Os padrinhos
que aguardam ao lado do campo, escuros como as gralhas que saltitam entre restolhos, são instados
a partir. Que não haja testemunhas.
[5] Afastados estes, Bem e Mal guardam as armas, se envolvem em suas capas e caminham até a taverna
mais próxima. Ali, frente a canecos cheios, discutirão estratégias e trocarão conselhos durante dias
ou séculos, até o próximo duelo.
É comum, no pensamento contemporâneo, o entendimento de que os conceitos de Bem e de Mal não são fixos, mas sim relativos a épocas e lugares.
Esse entendimento se reflete no conto quando o Bem e o Mal têm a atitude de:
Questão 20 987294
UERJ 2020/1O CONTO A SEGUIR FOI RETIRADO DO LIVRO HORA DE ALIMENTAR SERPENTES, DE MARINA COLASANTI.
PESCANDO NA MARGEM DO RIO
Era um homem muito velho, que cada manhã acordava certo de que aquela seria a última. E porque
seria a última, pegava o caniço, a latinha de iscas, e ia pescar na beira do rio. As poucas pessoas
que ainda se ocupavam dele reclamaram, a princípio. Que aquilo era perigoso, que ficava muito só,
que poderia ter um mal súbito. Depois, considerando que um mal súbito seria solução para vários
[5] problemas, deixaram que fosse, e logo deixaram de reparar quando ia. O velho entrou, assim, na
categoria dos ausentes.
Ausente para os outros, continuava docemente presente para si mesmo.
Ia ao rio com a alma fresca como a manhã. Demorava um pouco a chegar porque seus passos eram
lentos, mas, não tendo pressa alguma, o caminho lhe era só prazer. Não havia nada ali que não
[10] conhecesse, as pedras, as poças, as árvores, e até o sapo que saltava na poça e as aves que cantavam
nos galhos, tudo lhe era familiar. E embora a natureza não se curvasse para cumprimentá-lo, sabia-se
bem-vindo.
O dia escorria mais lento que a água. Quando algum peixe tinha a delicadeza de morder o seu
anzol, ele o limpava ali mesmo, cuidadoso, e o assava sobre um fogo de gravetos. Quando nenhuma
[15] presença esticava a linha do caniço, comia o pão que havia trazido, molhado no rio para não ferir
as gengivas desguarnecidas.
À noite, em casa, ninguém lhe perguntava como havia sido o seu dia.
Fazia-se mais fraco, porém.
E chegou a manhã em que, debruçando-se sobre a água antes mesmo de prender a isca na barbela
[20] afiada, viu faiscar um brilho novo. Apertou as pálpebras para ver melhor, não era um peixe. Movido
pela correnteza, um anzol bem maior do que o seu agitava-se, sem isca. Por mais que se esforçasse,
não conseguiu ver a linha, enxergava cada vez menos. Nem havia qualquer pescador por perto.
O velho não descalçou as sandálias, as pedras da margem eram ásperas.
Entrou na água devagar, evitando escorregar. Não chegou a perceber o frio, o tempo das percepções
havia acabado. Alongou-se na água, mordeu o anzol que havia vindo por ele, e deixou-se levar.
O conto constrói um paradoxo, que está formulado em: