Questões de Português - Gramática - Morfologia
Texto
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio tão amargo.
[5] Eu não tinha estas mãos tão sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
[10] Tão simples, tão certa, tão fácil:
– Em que espelho ficou retida
a minha face?
MEIRELES, Cecília. Retrato. In: Viagem [1939]. Rio de Janeiro, Ed. Global, 2012, p. 29
No excerto “Eu não tinha estas mãos tão sem força, Tão paradas e frias e mortas” (linhas 61-62), a adjetivação significa
Nos versos "Soa quando no fundo dos espelhos / Me é estranha e longínqua a minha face", o vocábulo "estranha" deve ser classificado como:
Leia o trecho da crônica Boca de Luar, de Carlos Drummond de Andrade, para responder à questão.
– Você tem boca de luar, disse o rapaz para a namorada, e a namorada riu, perguntou ao rapaz que espécie de boca é essa, o rapaz respondeu que é uma boca toda enluarada, de dentes muito alvos e leitosos, entende? Ela não entendeu bem e tornou a perguntar, desta vez que lua correspondia à sua boca, se era crescente, minguante, cheia ou nova. Ao que o rapaz disse que minguante não podia ser, nem crescente, nem nova, só podia ser lua cheia, uai. Aí a moça disse que mineiro tem cada uma, onde é que viu boca de lua cheia, até parece boca cheia de lua, uma bobice. O rapaz não gostou de ser chamada de bobice a sua invenção, exclamou meio espinhado que boca de luar, mesmo sendo de luar de lua cheia, é completamente diferente – insistiu: com-ple-ta-men-te – de boca cheia de lua; é uma imagem poética e daí isso não tem nada que ver com mineiro, [...] Ah, disse a moça, você ficou zangado comigo, diga, ficouzinho? bobo, te chamo de bobo como te chamo meu bem, fica nervosinho não, eu agora estou sentindo que o que você falou é uma graça, boca de luar é legal, olha aqui, vou te dar um beijo superluar, você quer? Ele ensaiou uma cara de quem não quer ser beijado, mas os lábios da moça estavam já assumindo forma de beijo, avançavam para ele num movimento que parecia comandar e concentrar todo o corpo, como resistir? Pois resistiu, se bem que com intenção de ceder: daí a pouco. [...] Então, é assim? falou baixinho a moça, você não quer o meu beijo oferecido de coração, pois não vai ter mais nenhum nem agora, nem depois de amanhã nem nunca, ouviu, seu bolha? [...] E eu vou sofrer com isso? o moço não disse mas falou consigo mesmo, que bem me importa se ela não quer mais me beijar? eu beijo outras, beijo a prima dela, beijo milhões e acabou-se. Mas a moça, que despachara os lábios para o sem-fim, continuava diante dele, muito saborosa e séria, séria e saborosa, aquela pele fina e dourada, aqueles olhões, aquele busto, aquilo tudo de primeiríssima beleza, sem falar na boca ausente mas presente, sabe como é? Ele não sabia, mas a vontade de provar o beijo reapareceu depois que o beijo fora recusado para todo o sempre, e o rapaz avançou o braço direito para pegar docemente no queixo da moça, quem disse que o queixo cedeu? Ele fez um gesto mais positivo, tentando segurar o ombro da moça, o ombro esquivou-se ao toque, embora ela não recuasse. Continuavam próximos um do outro, a uma distância infinita do entendimento. [...] A moça visivelmente esperava o ataque, ele visivelmente se proibia de atacar, isso durou um tempão, com o beijo parado em potencial entre os poucos centímetros de uma boca a outra, eis senão quando – ui! – uma formiga, não mais que uma formiguinha, vinda de não se sabe que subterrâneo preparado para expedi-la, em momentos que tais, começou a subir ziguezagueando pelo pescoço da moça, ela deu um grito, ele se precipitou para caçar a formiguinha, os rostos tocaram-se, os lábios também, e o beijo desabrochou, flor na ponta de duas hastes conjugadas, superlunar e inevitável, beijo fluido e forte, resultante da incompreendida imagem poética ou da formiguinha encomendada, quem sabe, pelo rapaz ou pela moça?
(Boca de Luar. 1984)
O termo “superlunar”, no contexto em que foi empregado no texto, pode ser entendido como:
Diploma não é solução
Vou confessar um pecado: às vezes, faço maldades. Mas não faço por mal. Faço o que faziam os mestres zen com seus "koans". "Koans" eram rasteiras que os mestres passavam no pensamento dos discípulos. Eles sabiam que só se aprende o novo quando as certezas velhas caem. E acontece que eu gosto de passar rasteiras em certezas de jovens e de velhos...
Pois o que eu faço é o seguinte. Lá estão os jovens nos semáforos, de cabeças raspadas e caras pintadas, na maior alegria, celebrando o fato de haverem passado no vestibular. Estão pedindo dinheiro para a festa! Eu paro o carro, abro a janela e na maior seriedade digo: "Não vou dar dinheiro. Mas vou dar um conselho. Sou professor emérito da Unicamp. O conselho é este: salvem-se enquanto é tempo!". Aí o sinal fica verde e eu continuo.
"Mas que desmancha-prazeres você é!", vocês me dirão. É verdade. Desmancha-prazeres. Prazeres inocentes baseados no engano. Porque aquela alegria toda se deve precisamente a isto: eles estão enganados.
Estão alegres porque acreditam que a universidade é a chave do mundo. Acabaram de chegar ao último patamar. As celebrações têm o mesmo sentido que os eventos iniciáticos – nas culturas ditas primitivas, as provas a que têm de se submeter os jovens que passaram pela puberdade. Passadas as provas e os seus sofrimentos, os jovens deixaram de ser crianças. Agora são adultos, com todos os seus direitos e deveres. Podem assentar-se na roda dos homens. Assim como os nossos jovens agora podem dizer: "Deixei o cursinho. Estou na universidade".
Houve um tempo em que as celebrações eram justas. Isso foi há muito tempo, quando eu era jovem. Naqueles tempos, um diploma universitário era garantia de trabalho. Os pais se davam como prontos para morrer quando uma destas coisas acontecia: 1) a filha se casava. Isso garantia o seu sustento pelo resto da vida; 2) a filha tirava o diploma de normalista. Isso garantiria o seu sustento caso não casasse; 3) o filho entrava para o Banco do Brasil; 4) o filho tirava diploma.
O diploma era mais que garantia de emprego. Era um atestado de nobreza. Quem tirava diploma não precisava trabalhar com as mãos, como os mecânicos, pedreiros e carpinteiros, que tinham mãos rudes e sujas.
Para provar para todo mundo que não trabalhavam com as mãos, os diplomados tratavam de pôr no dedo um anel com pedra colorida. Havia pedras para todas as profissões: médicos, advogados, músicos, engenheiros. Até os bispos tinham suas pedras.
(Ah! Ia me esquecendo: os pais também se davam como prontos para morrer quando o filho entrava para o seminário para ser padre – aos 45 anos seria bispo – ou para o exército para ser oficial – aos 45 anos seria general.)
Essa ilusão continua a morar na cabeça dos pais e é introduzida na cabeça dos filhos desde pequenos. Profissão honrosa é profissão que tem diploma universitário. Profissão rendosa é a que tem diploma universitário. Cria-se, então, a fantasia de que as únicas opções de profissão são aquelas oferecidas pelas universidades.
Quando se pergunta a um jovem "O que é que você vai fazer?", o sentido dessa pergunta é "Quando você for preencher os formulários do vestibular, qual das opções oferecidas você vai escolher?". E as opções não oferecidas? Haverá alternativas de trabalho que não se encontram nos formulários de vestibular?
Como todos os pais querem que seus filhos entrem na universidade e (quase) todos os jovens querem entrar na universidade, configura-se um mercado imenso, mas imenso mesmo, de pessoas desejosas de diplomas e prontas a pagar o preço. Enquanto houver jovens que não passam nos vestibulares das universidades do Estado, haverá mercado para a criação de universidades particulares. É um bom negócio.
Alegria na entrada. Tristeza ao sair. Forma-se, então, a multidão de jovens com diploma na mão, mas que não conseguem arranjar emprego. Por uma razão aritmética: o número de diplomados é muitas vezes maior que o número de empregos.
Já sugeri que os jovens que entram na universidade deveriam aprender, junto com o curso "nobre" que frequentam, um ofício: marceneiro, mecânico, cozinheiro, jardineiro, técnico de computador, eletricista, encanador, descupinizador, motorista de trator... O rol de ofícios possíveis é imenso. Pena que, nas escolas, as crianças e os jovens não sejam informados sobre essas alternativas, por vezes mais felizes e mais rendosas.
Tive um amigo professor que foi guindado, contra a sua vontade, à posição de reitor de um grande colégio americano no interior de Minas. Ele odiava essa posição porque era obrigado a fazer discursos. E ele tremia de medo de fazer discursos. Um dia ele desapareceu sem explicações. Voltou com a família para o seu país, os Estados Unidos. Tempos depois, encontrei um amigo comum e perguntei: "Como vai o Fulano?". Respondeu-me: "Felicíssimo. É motorista de um caminhão gigantesco que cruza o país!".
(ALVES, Rubem. Diploma não é solução. Disponível em: . Acesso em: 23 set. 2019.)
Considere a frase seguinte em seu contexto: “Essa ilusão continua a morar na cabeça dos pais”.
A palavra sublinhada possui a seguinte classificação morfológica:
Leia o poema de Álvares de Azevedo para responder a questão.
Adeus, meus sonhos!
Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não levo da existência uma saudade!
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo! votei meus pobres dias
À sina doida de um amor sem fruto...
E minh’alma na treva agora dorme
Como um olhar que a morte envolve em luto.
Que me resta, meu Deus?!... morra comigo
A estrela de meus cândidos amores,
Já que não levo no meu peito morto
Um punhado sequer de murchas flores!
(Lira dos vinte anos, 2011.)
No último verso do poema, o adjetivo “murchas” equivale a
Leia o poema de Álvares de Azevedo para responder à questão.
Adeus, meus sonhos!
Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!
Não levo da existência uma saudade!
E tanta vida que meu peito enchia
Morreu na minha triste mocidade!
Misérrimo! votei meus pobres dias
À sina doida de um amor sem fruto...
E minh’alma na treva agora dorme
Como um olhar que a morte envolve em luto.
Que me resta, meu Deus?!... morra comigo
A estrela de meus cândidos amores,
Já que não levo no meu peito morto
Um punhado sequer de murchas flores!
(Lira dos vinte anos, 2011.)
No último verso do poema, o adjetivo “murchas” equivale a
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