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Questão 11 8452704
UECE 1ª Fase 2023/1Texto
Da solidão
Há muitas pessoas que sofrem do mal da solidão.
Basta que em redor delas se arme o silêncio, que não se
manifeste aos seus olhos nenhuma presença humana, para
que delas se apodere imensa angústia: como se o peso do
[5] céu desabasse sobre sua cabeça, como se dos horizontes
se levantasse o anúncio do fim do mundo.
No entanto, haverá na terra verdadeira solidão?
Não estamos todos cercados por inúmeros objetos, por
infinitas formas da Natureza e o nosso mundo particular
[10] não está cheio de lembranças, de sonhos, de raciocínios,
de ideias, que impedem uma total solidão?
Tudo é vivo e tudo fala, em redor de nós, embora
com vida e voz que não são humanas, mas que podemos
aprender a escutar, porque muitas vezes essa linguagem
[15] secreta ajuda a esclarecer o nosso próprio mistério. Como
aquele Sultão Mamude, que entendia a fala dos pássaros,
podemos aplicar toda a nossa sensibilidade a esse
aparente vazio de solidão: e pouco a pouco nos sentiremos
enriquecidos.
[20] Pintores e fotógrafos andam em volta dos objetos
à procura de ângulos, jogos de luz, eloquência de formas,
para revelarem aquilo que lhes parece não só o mais
estático dos seus aspectos, mas também o mais
comunicável, o mais rico de sugestões, o mais capaz de
[25] transmitir aquilo que excede os limites físicos desses
objetos, constituindo, de certo modo, seu espírito e sua
alma.
Façamo-nos também desse modo videntes:
olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das
[30] cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos
tecidos sem maiores pretensões. Não procuremos neles a
beleza que arrebata logo o olhar, o equilíbrio de linhas, a
graça das proporções: muitas vezes seu aspecto – como o
das criaturas humanas – é inábil e desajeitado. Mas não é
[35] isso que procuramos, apenas: é o seu sentido íntimo que
tentamos discernir. Amemos nessas humildes coisas a
carga de experiências que representam, e a repercussão,
nelas sensível, de tanto trabalho humano, por infindáveis
séculos.
[40] Amemos o que sentimos de nós mesmos, nessas
variadas coisas, já que, por egoístas que somos, não
sabemos amar senão aquilo em que nos encontramos.
Amemos o antigo encantamento dos nossos olhos infantis,
quando começavam a descobrir o mundo: as nervuras das
[45] madeiras, com seus caminhos de bosques e ondas e
horizontes; o desenho dos azulejos; o esmalte das louças;
os tranquilos, metódicos telhados... Amemos o rumor da
água que corre, os sons das máquinas, a inquieta voz dos
animais, que desejaríamos traduzir.
[50] Tudo palpita em redor de nós, e é como um dever
de amor aplicarmos o ouvido, a vista, o coração a essa
infinidade de formas naturais ou artificiais que encerram
seu segredo, suas memórias, suas silenciosas experiências.
A rosa que se despede de si mesma, o espelho onde pousa
[55] o nosso rosto, a fronha por onde se desenham os sonhos
de quem dorme, tudo, tudo é um mundo com passado,
presente, futuro, pelo qual transitamos atentos ou
distraídos. Mundo delicado, que não se impõe com
violência: que aceita a nossa frivolidade ou o nosso
[60] respeito; que espera que o descubramos, sem anunciar
nem pretender prevalecer; que pode ficar para sempre
ignorado, sem que por isso deixe de existir; que não faz da
sua presença um anúncio exigente " Estou aqui! estou
aqui! ". Mas, concentrado em sua essência, só se revela
[65] quando os nossos sentidos estão aptos para descobrirem.
E que em silêncio nos oferece sua múltipla companhia,
generosa e invisível.
Oh! se vos queixais de solidão humana, prestai
atenção, em redor de vós, a essa prestigiosa presença, a
[70] essa copiosa linguagem que de tudo transborda, e que
conversará convosco interminavelmente.
MEIRELES, Cecília. Da solidão. In: MEIRELES, Cecília. Janela Mágica. São Paulo: Global, 2016, pp. 71-74.
A expressão destacada no trecho “Façamo-nos também desse modo videntes: olhemos devagar para a cor das paredes, o desenho das cadeiras, a transparência das vidraças, os dóceis panos tecidos sem maiores pretensões.” (linhas 28-31) pode ser substituída sem mudança de sentido por
Questão 4 8457822
Albert Einstein 2023Para responder a questão, leia um trecho do prefácio “Um gênero tipicamente brasileiro”, do escritor Humberto Werneck, publicado na antologia Boa companhia: crônicas.
Fernando Sabino e Rubem Braga, por longos anos obrigados a desovar crônicas diárias, não se limitavam, nas horas de aperto, a requentar seus requintados escritos — chegaram a permutar, na moita, velhos recortes, na suposição de que os textos, de tão antigos, já se houvessem apagado da memória do leitor de jornal, recuperando assim a virgindade tipográfica. O troca-troca, contado por Fernando Sabino na crônica “O estranho ofício de escrever”, merece ser aqui reproduzido:
Éramos três condenados à crônica diária: Rubem no Diário de Notícias, Paulo no Diário Carioca e eu no O Jornal. Não raro um caso ou uma ideia, surgidos na mesa do bar, servia de tema para mais de um de nós. Às vezes para os três. Quando caiu um edifício no bairro Peixoto, por exemplo, três crônicas foram por coincidência publicadas no dia seguinte, intituladas respectivamente: “Mas não cai?”, “Vai cair” e “Caiu”.
Até que um dia, numa hora de aperto, Rubem perdeu a cerimônia:
— Será que você teria aí uma crônica pequenininha para me emprestar?
Procurei nos meus guardados e encontrei uma que talvez servisse: sobre um menino que me pediu um cruzeiro para tomar uma sopa, foi seguido por mim até uma miserável casa de pasto da Lapa: a sopa existia mesmo, e por aquele preço. Chamava-se “O preço da sopa”. Rubem deu uma melhorada na história, trocou “casa de pasto” por “restaurante”, elevou o preço para cinco cruzeiros, pôs o título mais simples de “A sopa”.
Tempos mais tarde chegou a minha vez — nada como se valer de um amigo nas horas difíceis:
— Uma crônica usada, de que você não precisa mais, qualquer uma serve.
— Vou ver o que posso fazer — prometeu ele.
Acabou me dando de volta a da sopa.
— Logo esta? — protestei.
— As outras estão muito gastas.
Sou pobre mas não sou soberbo. Ajeitei a crônica como pude, toquei-lhe uns remendos, atualizei o preço para dez cruzeiros e liquidei de vez com ela, sob o título: “Esta sopa vai acabar”.
Eternamente deleitável ou imediatamente deletável — depende menos do tema do que das artes do autor —, a crônica pode não ser um “gênero de primeira necessidade, a não ser talvez para os escritores que a praticam”, como sustentava Luís Martins — um dos recordistas brasileiros nesse ramo de escreveção. Um subgênero, há quem desdenhe. “Literatura em mangas de camisa”, diz-se em Portugal. Mas, para o crítico Wilson Martins, trata-se de uma “espécie literária” que de jornalístico “só tem o fato todo circunstancial de aparecer em periódicos.”
(Humberto Werneck (org.). Boa companhia: crônicas, 2005. Adaptado.)
Está empregado em sentido figurado o termo sublinhado em:
Questão 54 9107249
UFPR 2023Leia o poema a seguir.
Tenho quebrado copos
é o que tenho feito
raramente me machuco embora uma vez sim
uma vez quebrei um copo com as mãos
era frágil demais foi o que pensei
era feito para quebrar-se foi o que pensei
e não: eu fui feita para quebrar
em geral eles apenas se espatifam
na pia entre a louça branca e os talheres
(esses não quebram nunca) ou no chão
espalhando-se então com um baque luminoso
tenho recolhido cacos
tenho observado brevemente seu formato
pensando que acontecer é irreversível
pensando em como é fácil destroçar
tenho embrulhado os cacos com jornal
para que ninguém se machuque
como minha mãe me ensinou
como se fosse mesmo possível
evitar os cortes
(mas que não seja eu a ferir)
tenho andado a tentar
não me ferir e não ferir os outros
enquanto esgoto o estoque de copos
mas não tenho quebrado minhas próprias mãos
golpeando os azulejos
não tenho passado a noite
deitada no chão de mármore
estudando as trocas de calor
não tenho mastigado o vidro
procurando separar na boca
o sabor do sangue o sabor do sabão
nem tenho feito uma oração
pelo destino variado
do que antes era um
e por minha força morre múltiplo
tenho quebrado copos
para isso parece deram-me mãos
tenho depois encontrado
cacos que não recolhi
e que identifico por um brilho súbito
no chão da cozinha de manhã
tenho andado com cuidado
com os olhos no chão
à procura de algo que brilhe
e tenho quebrado copos
é o que tenho feito
(MARQUES, Ana Martins. O livro das semelhanças. São Paulo. Companhia das Letras, 2015. p. 101-102.)
Considerando esse poema e a integralidade da obra de que foi retirado, assinale a alternativa correta.
Questão 10 9123974
FACISB 2023Leia o comentário crítico de João Pacheco, para responder à questão.
O sentimentalismo excessivo, que chegava por vezes ao pieguismo vulgar, o predomínio da imaginação, o subjetivismo avassalador, o transbordamento do eu, cansavam. Os temas se repetiam, a linguagem se descuidava, as concepções se tornavam convencionais. O emprego preferencial de alguns metros acabara por enfarar. Não menos enfadava a predileção por determinadas formas de composição, que ficaram por demais batidas. Causa de enfado era também a repetição constante do mesmo ritmo. Desgostava ainda o uso de metáforas e imagens que se haviam transformado em domínio comum. Enfim, este movimento havia perdido sua seiva e exauria-se na imitação.
(João Pacheco. A literatura brasileira, vol. III, 1963. Adaptado.)
Está empregada em sentido figurado a seguinte palavra do texto:
Questão 5 6272508
UNESP 2022/2Para responder a questão, leia o trecho do drama , de Álvares de Azevedo.
MACÁRIO (chega à janela): Ó mulher da casa! olá! ó de casa!
UMA VOZ (de fora): Senhor!
MACÁRIO: Desate a mala de meu burro e tragam-ma aqui...
A VOZ: O burro?
MACÁRIO: A mala, burro!
A VOZ: A mala com o burro?
MACÁRIO: Amarra a mala nas tuas costas e amarra o burro na cerca.
A VOZ: O senhor é o moço que chegou primeiro?
MACÁRIO: Sim. Mas vai ver o burro.
A VOZ: Um moço que parece estudante?
MACÁRIO: Sim. Mas anda com a mala
A VOZ: Mas como hei de ir buscar a mala? Quer que vá a pé?
MACÁRIO: Esse diabo é doido! Vai a pé, ou monta numa vassoura como tua mãe!
A VOZ: Descanse, moço. O burro há de aparecer. Quando madrugar iremos procurar.
OUTRA VOZ: Havia de ir pelo caminho do Nhô Quito. Eu conheço o burro...
MACÁRIO: E minha mala?
A VOZ: Não vê? Está chovendo a potes!...
MACÁRIO (fecha a janela): Malditos! (atira com uma cadeira no chão)
O DESCONHECIDO: Que tendes, companheiro?
MACÁRIO: Não vedes? O burro fugiu...
O DESCONHECIDO: Não será quebrando cadeiras que o chamareis...
MACÁRIO: Porém a raiva...
[...]
O DESCONHECIDO: A mala não pareceu-me muito cheia. Senti alguma coisa sacolejar dentro. Alguma garrafa de vinho?
MACÁRIO: Não! não! mil vezes não! Não concebeis, uma perda imensa, irreparável... era o meu cachimbo...
O DESCONHECIDO: Fumais?
MACÁRIO: Perguntai de que serve o tinteiro sem tinta, a viola sem cordas, o copo sem vinho, a noite sem mulher – não me pergunteis se fumo!
O DESCONHECIDO (dá-lhe um cachimbo): Eis aí um cachimbo primoroso.
[...]
MACÁRIO: E vós? O DESCONHECIDO: Não vos importeis comigo. (tira outro cachimbo e fuma)
MACÁRIO: Sois um perfeito companheiro de viagem. Vosso nome?
O DESCONHECIDO: Perguntei-vos o vosso?
MACÁRIO: O caso é que é preciso que eu pergunte primeiro. Pois eu sou um estudante. Vadio ou estudioso, talentoso ou estúpido, pouco importa. Duas palavras só: amo o fumo e odeio o Direito Romano. Amo as mulheres e odeio o romantismo.
O DESCONHECIDO: Tocai! Sois um digno rapaz. (apertam a mão)
MACÁRIO: Gosto mais de uma garrafa de vinho que de um poema, mais de um beijo que do soneto mais harmonioso. Quanto ao canto dos passarinhos, ao luar sonolento, às noites límpidas, acho isso sumamente insípido. Os passarinhos sabem só uma cantiga. O luar é sempre o mesmo. Esse mundo é monótono a fazer morrer de sono.
O DESCONHECIDO: E a poesia?
MACÁRIO: Enquanto era a moeda de ouro que corria só pela mão do rico, ia muito bem. Hoje trocou-se em moeda de cobre; não há mendigo, nem caixeiro de taverna que não tenha esse vintém azinhavrado¹. Entendeis-me?
O DESCONHECIDO: Entendo. A poesia, de popular tornou-se vulgar e comum. Antigamente faziam-na para o povo; hoje o povo fá-la... para ninguém...
(Álvares de Azevedo. Macário/Noite na taverna, 2002.)
1azinhavrado: coberto de azinhavre (camada de cor verde que se forma na superfície dos objetos de cobre ou latão, resultante da corrosão destes quando expostos ao ar úmido).
Observa-se expressão empregada em sentido figurado na seguinte fala:
Questão 8 6312531
FCMSCSP - Santa Casa 2022Leia o artigo intitulado “Tempus fugit”, de Hélio Schwartsman, para responder à questão.
Depois de nos privar de Plutão, que teve sua planetariedade cassada em 2006, cientistas agora ameaçam bagunçar o tempo.
Pretendem eliminar os segundos bissextos ocasionalmente introduzidos no calendário para fazer com que o tempo dos relógios atômicos (oficialmente, 1 segundo equivale a 9.192.631.770 ciclos de radiação emitidos pelo césio-133) não se divorcie de vez do tempo astronômico, em que o segundo vale 1/86.400 do dia.
Até os anos 60, a astronomia era a guardiã absoluta do tempo, mas aí descobrimos que o planeta é pouco pontual: a velocidade da rotação terrestre atrasa um número variável de milissegundos a cada ano.
Se os segundos corretivos forem de fato eliminados [...], o tempo se tornará mais abstrato. Não dirá mais respeito à noite, ao dia, às estações e aos anos.
Os cientistas, é claro, têm suas razões. O problema é que nossos corações são insensíveis a elas. O tempo encerra uma dimensão psicológica à qual não podemos escapar.
Nas “Confissões”, santo Agostinho vislumbrou o tamanho da encrenca: “Se nada sobreviesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existiria o tempo presente. De que modo existem aqueles dois tempos — o passado e o futuro —, se o passado já não existe e o futuro ainda não veio? Quanto ao presente, se fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, já não seria tempo, mas eternidade.”
Não é por acaso que, além de Agostinho, vários filósofos se apressaram a concluir que o tempo não passa de uma ilusão. Mesmo que ele seja uma realidade ontológica, como querem os físicos, continua despertando perplexidades e até paixões.
Nem toda ciência, filosofia e poesia do mundo nos fazem deixar de lamentar o passado e temer o futuro. Quem traduziu bem esse sentimento foi Virgílio: “Sed fugit interea, fugit irreparabile tempus” (mas ele foge: foge irreparavelmente o tempo).
(Folha de S.Paulo, 20.01.2012.)
No texto, está empregado em sentido figurado o seguinte termo: