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O TEMPO E OS TEMPOS
Mario Quintana
Vivemos conjugando o tempo passado (saudade, para os românticos) e o tempo futuro (esperança, para os idealistas). Mais felizes os animais, que, na sua gramática imediata, apenas lhes sobra um tempo: o presente do indicativo. E que nem dá tempo para suspiros...
Na idade em que eu fazia umas ficções – é o termo – um dia o Erico Veríssimo me disse, naquela sua maneira discreta e indireta de dar conselho: deve-se escrever sempre no presente do indicativo, dá mais vida à ação, às personagens, o leitor se sente como uma testemunha ocular do caso.
Trinta e seis anos depois, o crítico Fausto Cunha notou a preferência, em meus poemas, pelo pretérito imperfeito. Por quê? Não sei, mas deve ser porque o tempo passado empresta às coisas um sabor definitivo, esse misterioso sentimento de saudade com que a gente olha uma cena num quadro de Renoir, um Anjo ou uma Vênus de Boticelli. Sem escusar-me, eu diria que o pretérito imperfeito não é um tempo morto: é um tempo continuativo...
Porém, voltemos ao Erico. Confesso-lhe que sempre penso nele no presente do indicativo. Ele está aqui, tão presente que nem dá tempo para a saudade.
(QUINTANA, Mario. A Vaca e o Hipogrifo. Rio de Janeiro: Mediafashion, 2008, p. 51 e 255. Adaptado.)
Sobre as ideias do autor acerca da experiência temporal e do modo como a linguagem verbal a representa, são feitas as seguintes afirmações:
I. Para diferenciar o humano e os animais, o autor afirma a vantagem destes por não lastimarem nostalgicamente o que já aconteceu e não ansiarem imaginosamente pelo porvir -– eles vivem o instantâneo, o imediato do momento presente.
II. Se o crítico aponta para uma recorrência estilística, nos poemas de Quintana, a mesma preferência por certo tempo verbal verifica-se igualmente nesse seu texto em prosa, onde predomina o passado continuativo usado para representar fatos definitivos ou não concluídos.
III. A repetição da mesma palavra no título, apenas flexionada em número, antecipa o jogo com seus diferentes significados que o autor mobilizará no restante do texto; processo semelhante ocorre no último parágrafo, com os dois sentidos com os quais é usada a palavra “presente”.
É correto o que se afirma em