TEXTO
O medo faz você consumir mais do que o desejo de ser feliz
(Samy Dana)
[1] Você já deve ter ouvido por aí a expressão “família de comercial de margarina”. A designação
resume bem o estereótipo que a propaganda cria: uma família perfeita; um cachorro de raça ao lado da
mesa, todos felizes com um dia ensolarado e uma casa bonita. Cena que retrata uma felicidade nem sempre
condizente com a realidade.
[5] “Vender felicidade” é uma das estratégias da publicidade, mas outros fatores são importantes e
decisivos em nosso impulso para consumir. O medo é um dos mais comuns.
Um dos primeiros produtos a seguir esse tipo de raciocínio para ser vendido foi o antisséptico bucal
Listerine. A propaganda criava uma ansiedade no público quanto a um risco iminente: uma mulher com um
belo sorriso, mas que tinha dificuldade para se relacionar com os outros porque sofria de halitose.
[10] Os comerciais seguintes seguiam a mesma linha, fazendo questão de enfatizar que a halitose poderia
afetar qualquer um e que pessoas próximas ficariam constrangidas a alertar para o problema. O desfecho:
Listerine como “solução milagrosa”.
O exemplo do antisséptico é mencionado na segunda parte do documentário britânico “The Men
Who Made us Spend”, produzido pela BBC. A ideia do comercial surgiu de Stanley Wrestle, um dos
[15] primeiros a usar a estratégia de explorar as motivações humanas para gerar consumo.
Os reflexos disso continuam sendo replicados até hoje. É possível pensar em uma enorme gama de
produtos que são consumidos porque previamente foi gerada uma ansiedade, uma necessidade de consumo
para se sentir seguro ou protegido.
Na indústria farmacêutica, de cosméticos e saúde, essa técnica fica mais evidente. Isso explica, por
[20] exemplo, o motivo dos tais sucos Detox terem se transformado em febre nacional, mesmo sem prova
científica de efeitos benéficos. Se o comercial de sabonete for feito focando na quantidade de bactérias às
quais estamos expostos, é possível que você fique mais propenso a comprar um antibacteriano do que um
sabonete comum, ainda que os médicos considerem isso desnecessário e até prejudicial.
Cosméticos e tratamentos estéticos inflam os lucros a cada ano, alimentados pelo medo que as
[25] pessoas têm de envelhecer.
Os medos gerados pelos comerciais ficam incutidos em nosso subconsciente. Quando for às
compras, alimente o hábito de se questionar com mais frequência. Analise se você realmente precisa daquilo
ou se é apenas a persuasão da ansiedade e do medo que está levando ao consumo.
(Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br>. Acesso em: 25 ago. 2015.)
No enunciado do texto: “Analise se você realmente precisa daquilo [...]” (linha 27), a palavra destacada